Entrevista: Greg Van Avermaet – Campeão Olímpico de Estrada 2016

Quase 1 mês depois de vencer a prova de estrada dos Jogos Olímpicos do Rio, o belga Greg Van Avermaet concedeu entrevista na qual falou sobre a prova, sobre a decisão de Peter Sagan em correr a prova de MTB, sobre os efeitos da vitória em sua vida e também sobre possíveis alterações, para melhorar a competitividade, nas regras das provas.

Leia, abaixo, partes da entrevista que transcrevemos para vocês.

Pergunta: Como foram os Jogos e como é ser o campeão olímpico?

Greg Van Avermaet: Tem sido muito bom. Estou muito feliz com a minha vitória. Não era realmente esperado porque foi um percurso muito duro. Não era o melhor percurso pra mim, mas eu acreditava que poderia fazer uma boa prova e ir bem mesmo em um percurso assim.

No final, eu ganhei. Pra mim, foi a maior vitória da minha carreira.

Pergunta: Como foi, depois de perder o Tour de Flandres, se reorientar para os Jogos Olímpicos?

https://www.youtube.com/watch?v=QUQ7bJ4gYSw

Nota: GVA quebrou a clavícula no Tour de Flanders deste ano, a principal prova na bélgica e uma das maiores clássicas do ciclismo mundial (a maior depois da Paris Roubaix), é como se o um grande craque se lesionasse na final de um campeonato!

GVA: Foi muito difícil, porque o meu objetivo principal sempre foram as clássicas. No início do ano eu estava indo muito bem com a bela vitória no Tirreno e alguns outros bons resultados. Minha preparação estava indo muito bem para Flandres e Roubaix, que eram meus principais objetivos do ano.

Falhar em Flandres foi uma grande decepção porque eu estava me sentindo ótimo naquele dia.

Foi difícil me recuperar, mas tive que definir outros objetivos. O outro objetivo era, antes de tudo, o Tour e, em seguida, fazer muito bem a prova dos Jogos Olímpicos e agora o mundial do Qatar. Esses dois objetivos foram bons e agora espero que eu consiga fazer um bom resultado também no Qatar.

Pergunta: Você acha que foi fundamental estar mais descansado, por não ter que se esforçar tanto no Tour, por ex., para vencer no Rio?

GVA: Sim, com certeza, é muito mais difícil se você teve que correr três semanas do Tour a todos gás. Você está estressado todos os dias. Em termos de fadiga, não poder perder nem um segundo faz grande diferença no final de um Grand Tour. Eu apenas foquei em alguns dias do Tour (GVA venceu a quinta etapa, assumiu a liderança da camisa amarela a qual usou durante três etapas) e, mesmo assim, chegar a Paris foi muito difícil. Mas, sem dúvida, que não ter dado o máximo todos os dias fez com que minha recuperação pós prova fosse mais rápida. Na San Sebastian eu tive boas sensações e percebi como estava minha forma, fiz quinto e não faltou muito para estar no primeiro grupo.

Às vezes você precisa estar em um dia especial e os outros não terem o melhor dia.

No Rio, tive um pouco de sorte e também tivemos a queda do Nibali e do Henao, caso contrário, a história poderia ter sido diferente. Mas, isso tudo faz parte da corrida. Alguns caras acabam assumindo mais riscos e outros preferem ser um pouco mais conservadores.

epa05459411 Greg van Avermaet of Belgium celebrates winning the men's Road Cycling race of the Rio 2016 Olympic Games in Rio de Janeiro, Brazil, 06 August 2016.  EPA/JAVIER ETXEZARRETA
Greg van Avermaet
Foto: Javier Etxezarreta

Pergunta: Você estava no grupo da frente de alguns favoritos na parte final da prova. Você acha que isso foi fundamental para a vitória?

GVA: Eu acho que foi uma boa estratégia ter ido para os grupos da frente um pouco mais cedo. Esse era o meu plano antes da corrida. Tivemos que trabalhar muito na frente e  nunca estivemos a mais de 50 segundos do grupo. Quem estava atrás estava gastando um pouco menos, mas quando eles chegaram eles não tinham tanta energia assim. Acabei gastando um pouco mais de energia, mas, no final, quando estavam Henao, Nibali e Majka, eu estava forte o suficiente.

Então foi um pouco de sorte e tática estar na disputa da vitória da corrida no final.

Pergunta: Você poderia nos falar um pouco do final, a descida e depois a perseguição ao Majka no plano? Quais foram seus pensamentos e emoções na reta final?

GVA: Eu queria apenas ir o mais longe fosse possível. Eu estava sofrendo muito na última subida, mas sentia que os outros não estavam tão mais fortes do que eu. Nibali, Henao e Majka estavam logo acima, a apenas 10, 15 segundos. Então, tudo ainda era possível. Na descida corremos muitos riscos e vi vários caras no chão, acabei perdendo um pouco a noção de quantos ainda estavam na frente. Logo depois, o treinador da equipe nacional disse que só havia um cara (Majka) na frente.

Ele chegou a dizer que talvez fosse melhor me manter ali e ir para o sprint para tentar o segundo ou terceiro lugar. Mas eu ainda acreditava que daria pra buscá-lo. Depois, quando eu e Fuglsang estávamos indo, percebi que estávamos muito rápido e poderíamos pegar. Faltavam 2 a 3 quilômetros e eu apenas me mantive focado. Eu sabia que era o cara mais rápido dos três, mas ainda tinha que ganhar. Por isso foi importante não perder o foco nos quilômetros finais. Ir para o sprint era realmente a coisa mais fácil durante a corrida.

Pergunta: Fazendo um retrospecto, você acha que Peter Sagan cometeu um erro ao não correr a prova de estrada?

GVA: Com certeza ele teria grandes chances de vencer. Ele é  um piloto muito parecido comigo. Ele é um pouco melhor no sprint, um pouco melhor escalador. Então, com certeza ele teria chances.

Mas não foi um erro, às vezes você toma uma decisão e tem que seguir com ela. Se ele tivesse ganho uma medalha na prova de MTB, talvez essa pergunta nem fosse feita. Ele  não teve tanta sorte. Basta ver o início (da prova de MTB), ele foi realmente impressionante.

E também acho que muitas pessoas assistiram a prova só para vê-lo. Então ele também ajudou a dar uma atenção maior para o evento. Eu acredito que isso também é bom para o ciclismo. As pessoas se interessaram ainda mais pela prova de MTB.

Equipes menores são melhores para as provas

Belgian cyclist Greg Van Avermaet (2nd L) and Belgian cyclist Philippe Gilbert (R) in action at the men's road race cycling event at the 2016 Olympic Games in Rio de Janeiro, Brazil, Saturday 06 August 2016.  BELGA PHOTO YUZURU SUNADA
Equipe Belga no Rio com Greg Van Avermaet (segundo) e Philippe Gilbert (quarto)
Photo: Yuzuru Sunada

Ao contrário de todas as outras provas do calendário, a corrida de estrada olímpica tem o diferencial ser disputado equipes muito menores. As maiores equipes são compostas por apenas cinco pilotos. Van Avermaet falou um pouco sobre isso.

GVA: Eu acho que as provas com menos pilotos nas equipes tornam a corrida difícil de controlar, dando mais oportunidade aos ataque. Isso é o que eu mais gosto. Nos Jogos Olímpicos, com apenas cinco caras nas maiores equipe não houve muito controle.

Eu acho que seria interessante fazer isso em outras provas. Talvez diminuir o número de pilotos torne o ciclismo mais atrativo e aberto.

Pergunta: Houve uma conversa sobre a redução dos pilotos no Tour de France. Você acha que isso tornaria a prova mais segura?

GVA: Eu acho que sim. Nós precisamos tentar. Talvez não diretamente no Tour, mas em outras provas como o Dauphine, Paris-Nice ou Tirreno-Adriatico.

Seria muito bom ver como o pelotão e as equipes reagiriam com menos pilotos.

O calendário WordTour do próximo ano é tão grande, talvez isso seja um problema para várias equipes que possuem apenas 25 pilotos. É difícil estar em todas as provas. Então, ter menos atletas em algumas provas seja uma boa ideia.

Pergunta: Quantos pilotos seria o ideal?

GVA: Em um Grand Tour (Tour de France, Giro d’Itália e Vuelta a Spaña) acho que poderíamos pensar em seis ou talvez sete. Porque em um Grand Tour, você também tem alguns problemas na primeira semana. Alguns caras ficam doentes. Há acidentes com maior frequência. Então talvez sete seja um bom número e seis para provas de um dia.

Mudanças pós vitória no Rio e objetivos futuros

Pergunta: O que mudou em sua vida desde que se tornou campeão olímpico?

GVA: Mudou um pouco. Eu já era bastante popular na Bélgica. Lá você tem o futebol e o ciclismo como os principais esportes. Se você é um dos melhores ciclistas na Bélgica você já é popular.

Mas agora, com os Jogos Olímpicos, ficou muito maior. Quando você vê tantas pessoas saindo para rua para te ver, é uma sensação um pouco estranha.

Na primeira semana após os Jogos Olímpicos foi difícil sair e fazer minhas próprias coisas. Todo mundo quer tirar uma foto com você, conversar um pouco. Eu gosto, mas estava um pouco demais. Ainda quero viver minha vida normal, ir ao supermercado, sair para jantar com a família. Mas eu acho que é normal depois dos Jogos Olímpicos. Espero que isso vá diminuindo com o passar dos dias.

Pergunta: Você foi o segundo belga a ganhar o ouro olímpico. Cruzar a linha com a camisa belga e ganhar o ouro para o seu país foi diferente do que ganhar uma prova do calendário regular para a BMC?

GVA: Sim, com certeza. Os Jogos Olímpicos é muito maior do que qualquer coisa. Há alguns anos, no ciclismo, não se dava muito valor em ir aos jogos, os caras iam por ir, sem a motivação necessária. Isso está mudando, nos últimos dez, doze anos, eu acho que a importância cresceu muito.

Para mim, ouro olímpico sempre foi a maior vitória que um ciclista poderia alcançar.

Eu estava em Londres, e estava muito feliz apenas de estar lá. Se você é um dos escolhidos para representar o seu país nos Jogos Olímpicos você tem que ficar muito feliz e respeitar esse fato.

Foi o que eu fiz esse ano. Eu apenas queria fazer o melhor que eu pudesse para o meu país. O meu pai também foi para os Jogos Olímpicos de Moscou, em 1980. Para ele ir aos Jogos foi o destaque de sua carreira e pra mim também é, apenas por participar.

Ser campeão olímpico é o máximo. O momento em que você percebe que venceu é um dos melhores sentimentos.

Greg Van Avermaet
Greg Van Avermaet

Pergunta: Está nos planos vencer Flanders na próxima temporada?

GVA: Sim, com certeza. Posso dizer que uma meta que tenho na minha carreira é ganhar uma grande clássica como Flanders. Flanders é para mim a corrida mais importante. É a prova que mais gosto também.

Eu algumas vezes estive bem perto de vencê-la. Eu já fui segundo, terceiro. Este ano também acreditava que poderia ir para o pódio, mas corrida é assim.

Eu ainda tenho alguns anos pela frente. Quem sabe ano que vem. Mas é uma corrida de um dia e muitas coisas podem acontecer. Você sempre tem que se preparar bem e esperar que naquele dia de tudo certo.

Pergunta: E o Mundial desse ano. Quais as expectativas da Bélgica e as suas de vencer?

GVA: Eu acho que as chances são como as que tivemos no Rio. Temos uma equipe forte, mas não somos os grandes favoritos porque não temos um grande velocista no nosso time.

Eu acho que Boonen está indo muito bem. Temos alguns jovens que têm um bom sprint, mas não são como Degenkolb, Greipel ou Cavendish. Portanto, temos que ser um pouco conservadores.

Esperemos que tenha muito vento. Assim podemos ser fortes e ir com um pequeno grupo até o fim. Isso é o que nós queremos.

As pessoas sempre dizem que vai ser um sprint, mas eu não estou tão certo sobre isso. Eu acho que vai ser uma corrida difícil com muito vendo e calor e acredito que o vencedor deverá ser um cara bom de clássicas e com um bom sprint.

Jakob Fuglsang (Dinamarca), Greg Van Avermaet (Bélgica); Rafal Majka (Polônia)
Jakob Fuglsang (Dinamarca), Greg Van Avermaet (Bélgica); Rafal Majka (Polônia)

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